09 outubro 2019

JORNALISMO E PERIFERIAS



No último domingo (06), a Comunidade Tradicional Pesqueira Ilha de Deus sediou a última etapa do curso Jornalismo e Periferias, uma proposta realizada pela Escola de Jornalismo ÉNois e ABRAJI (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) em parceria com a Marco Zero Conteúdo e apoio da Google News Initiative. Durante três dias, estudantes, jornalista, militantes de movimentos sociais e profissionais que trabalham em prol da comunicação, trocaram saberes, experiências e refletiram sobre os desafios em realizar um jornalismo ético, comprometido com os direitos humanos, embasado pela investigação de dados e atento aos cuidados digitais. "A iniciativa é importante para o debate público, uma vez que conecta diferentes esperiências de jornalismo, realizados por coletivos e veículos que trazem outras narrativas, de outras perspectivas, longe dos centros urbanos e das redações tradicionais", destaca Débora Britto (Marco Zero Conteúdo). De acordo com a repórter, o apoio, valorização e fortalecimento desses grupos é essencial  para trazer outras notícias, de outros pontos de vista. Visto que, a cidade muitas vezes ignora quem tá na periferia e quem comunicação à partir da sua própria realidade.

 
 

 
Para a jornalista de dados Géssika Costa (Agência TATU / Coletivo O Que Os Olhos Não Veem Em Maceió), oportunidades como essa, possibilitam a construção de um jornalismo cada vez mais diverso, plural e independente, uma vez que a simbiose entre as diferentes experiências fortalece a comunicação social. "Tão importante quanto os conhecimentos técnicos, são o uso da LAI (Lei de Acesso à Informação) e a segurança digital". Sobre os principais enfrentamentos encontrados no exercício do jornalimo, enfatiza com estatísticas alagoanas: "A maior dificuldade ainda é a violência, nas mais variadas formas. Na terra onde hospedou o maior quilombo conhecido das Américas, o Quilombo dos Palmares, uma pessoa negrta tem 17 vezes mais chance de ser assassinada do que uma pessoa branca. As pessoas que trabalham para denunciar esses casos também estão na mira. As pessoas que trabalham para denunciar esses casos também estão na mira. Para quem vai cobrir como comunicador social, como jornalista, a dificuldade é o enfrentamento à violência". Ela ainda aponta para um elemento crucial no jornalismo independente, "a questão do apoio financeiro para que nossas ideias possam ser executadas e fazer a diferença na vida de quem mais precisa".


  
A disputa entre o discurso da mídia hegemômica e uma contra-narrativa é pauta recorrente na Ilha de Deus e em outros territórios considerados periféricos nas grandes cidades. A estigmatização destas comunidades, consideradas como populações em vulnerabilidade social sempre estampou as capas e páginas dos principais veículos de comunicação impressa, radiodifusora e televisiva. Porém, o surgimento e fortalecimento das redes de comunicação associados à ações de empoderamento vem transformando essa realidade, como relata Júnior Silva (Rede de Agentes Comunitários de Comunicação / Agência de Notícias das Favelas): "O Ibura (bairro da zona sul de Recife) vem se fortalecendo com a formação de grupos e coletivos que combatem preconceitos (lgbtfobia, racismo, fascismo) dentro das periferias e vem trabalhando de forma a se organizar, ocupando o território, assumindo a identidade cultural e politizando o pensamento à partir da sua vivência".
Para Júnior, produtor de conteúdo do jornal A Voz da Favela, o curso permite a possibilidade de fazer intercâmbio jornalístico à partir da visão da periferia, o que considera contra-hegemônico, frente a um projeto de jornalismo estabelecido, onde apenas a grande mídia, cujos interesses são privados, ganha visibilidade. "É importante para o crescimento do movimento, pois permite integração entre vários territórios, aumentando o leque de possibilidades para eventos conjuntos e iniciativas que possam ser desenvolvidas em várias localidades ao mesmo tempo ou em sequência". Segundo Silva, este processo estabelece uma organização que permite a democratização da comunicação, fazendo com que a informação não apenas chegue, mas seja entendida por toda a população. "A produção de conteúdo voltado para a periferia, mas que traz a visão da própria favela", afirma.

O curso Jornalismo e Periferias aconteceu entre os dias 04, 05 e 06 de Outubro na UNICAP em Recife, mas contou com representantes de outras cidades da Região Metropolitana e de 3 estados nordestinos. Depois de ter passado pelas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, o curso segue para mais uma edição, dessa vez em Belo Horizonte, durante o período de 25 a 27 do mês corrente.




































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